quinta-feira, 15 de agosto de 2024

[CONTO] Queens, Yale, Serra do Lago - II

Quatro dias após a conversa sobre seus sentimentos, Junior saía do treino de MMA, mas sua mente estava longe, dividida entre Aline e sua ambição de ingressar no The Ultimate Fighter America. Ele estava perdido nesses pensamentos quando Jade Powell, uma lutadora impressionante, aproximou-se. Ela tinha 19 anos, era uma mulata do Brooklyn com pernas bem torneadas e um abdômen definido, evidências de sua disciplina no esporte. Seus olhos brilhavam com a paixão pela luta, e Junior não pôde deixar de notar o quanto ela era linda.

Eles começaram a conversar ali mesmo, na saída do ginásio. A conversa fluía facilmente, ambos compartilhando histórias sobre seus lutadores favoritos e discutindo as nuances do MMA. Jade era cativante, e Junior se via atraído por ela, sentindo uma conexão inesperada. Ainda assim, enquanto eles riam e se entendiam tão bem, a sombra de Aline continuava a pairar sobre sua mente, como se algo o impedisse de se entregar completamente ao momento.

Quando Jade pediu uma carona para casa, Junior concordou sem hesitar. Eles entraram no Chevrolet Cruze 2018, que Junior havia comprado com grande esforço, trabalhando como chapeiro por 10 dólares a hora em um emprego part-time. Durante o trajeto, eles continuaram a conversar, e Junior se viu cada vez mais encantado por Jade, mas ao mesmo tempo, mais consciente do peso de seus sentimentos por Aline.


Finalmente, chegaram à casa de Jade. Junior estacionou o carro e a acompanhou até a porta. O clima, que antes era leve e descontraído, tornou-se subitamente carregado de tensão. Jade, com um sorriso tímido, fechou os olhos e se aproximou dele, insinuando um beijo. Por um instante, Junior se permitiu imaginar como seria ceder àquele impulso, mas a imagem de Aline surgiu em sua mente, clara e perturbadora.

Ele recuou levemente, com um sorriso gentil, tentando aliviar a situação.

— Foi uma alegria te conhecer, Jade — disse ele, sua voz carregada de sinceridade, mas também de um peso que ele não conseguia ignorar.

Jade abriu os olhos, percebendo a hesitação de Junior. Ela sorriu de volta, tentando esconder a decepção.

— Igualmente, Junior. Espero te ver de novo no treino — respondeu ela antes de entrar em casa, deixando Junior sozinho na escuridão.

Enquanto dirigia de volta para a Southgate Boulevard, Junior mal conseguia processar o que havia acontecido. Jade era incrível, e qualquer outro momento ele teria se deixado levar. Mas Aline estava sempre presente em seus pensamentos, uma presença silenciosa e poderosa que ele não conseguia ignorar.

Ao chegar em casa, encontrou a cena já familiar: Aline dormindo debruçada sobre pilhas de livros, o cheiro de morango de seus cabelos enchendo o ambiente. Junior sentiu um misto de carinho e tristeza ao vê-la assim, tão dedicada, mas também tão distante. Ele se aproximou, pronto para pegá-la no colo e levá-la para cama, como fizera tantas outras vezes. Mas então, algo diferente aconteceu.

Aline começou a balbuciar palavras em seu sono. No início, eram murmúrios incoerentes, mas logo as palavras tomaram forma, e Junior percebeu que ela estava sonhando com ele.

No sonho de Aline, eles estavam juntos na Biblioteca do Congresso, em Washington, D.C. Ela estava diante dele, recitando um trecho da Declaração de Independência:

— "Mas quando uma longa série de abusos e usurpações, perseguindo invariavelmente o mesmo objetivo, indica o desígnio de reduzir o povo ao despotismo absoluto, pertence ao povo o direito, bem como o dever, de abolir tais governos e instituir novos garantias para sua futura segurança".

Junior a observava, encantado com a paixão que ela colocava em cada palavra, mesmo em seu sonho. Ele via nos olhos dela o fogo que a movia, o desejo de fazer algo grandioso, de liderar e mudar o mundo. Em seu sonho, Junior não resistiu; ele se aproximou e a segurou pelas mãos, olhando fundo nos olhos dela.

— Você é maravilhosa, Aline — disse ele, sua voz suave, mas cheia de sentimento. — Eu te amo.

Aline, ainda sonhando, respondeu. Sua voz era um sussurro, mas carregava uma verdade que ela nunca havia expressado acordada.

— O que sinto por você... é tão puro quanto o que sinto por minha cidade. — Ela hesitou, como se estivesse lutando contra o próprio medo. — Mas tenho tanto medo, Junior. Medo de destruir tudo. De falhar com você... e com meus sonhos.

Junior, ainda segurando-a, sentiu seu coração apertar. Ele estava ouvindo uma confissão que Aline nunca havia feito em palavras conscientes. Aquela revelação, tão íntima e vulnerável, o tocou profundamente. Ele compreendeu que, por trás da força e determinação de Aline, havia inseguranças que ela raramente permitia que alguém visse.

De volta à realidade, Junior a observava dormindo, as palavras do sonho ecoando em sua mente. Com cuidado, ele a ergueu nos braços. Junior não entendia nada de história, política, magia ou economia. Mas ele entendia do amor que Aline tinha pelos seus ideais. E ele a amava por ser tão ingenuamente idealista. Ele sabia que o mundo era duro, mas sentia que aqueles sentimentos eram tão puros e elevados que seria uma tragédia se ela os abandonasse e deixasse de crer neles. Seu amor se agudizou e ele não se conteve.

Seria uma violência? Um abuso? Machismo? Num ímpeto, ele com Aline ainda dormindo, e com ela nos braços, Junior a beijou. Um beijo doce, inicialmente inerte. Mas logo correspondido. Os lábios de ambos tocavam-se, encaixavam-se, sentiam-se. Na mente de Junior, ele estava com ela na biblioteca apaixonadamente se beijando, e ele via tudo com seus olhos fechados. Uma música ressoava como que vindo da transcendência: "We might as well be strangers in another town, we might as well be living in another time". Ao despertar de seu sonho, sentiu as mãos quentes e macias de Aline deslizando por seu rosto. Ele não estava sonhando, seu beijo estava sendo correspondido.

Ele abriu os olhos e afastou-se lentamente de Aline, podendo assim ver seu rosto com traços delicados. Para sua surpresa, ela estava dormindo, com um sorriso genuíno e gentil no rosto. Talvez ainda sonhando com um beijo apaixonado na biblioteca do congresso. Gentilmente Junior a depositou na cama, com ela presa em seu sonho. E deitando-se ao seu lado, olhava para ela perdida no Oníron enquanto sabia que apostar no amor que sempre nutriu era a decisão certa.

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